in , ,

Review: Coldplay se limita à própria fórmula em “Music Of The Spheres”

coldplay
Foto: Divulgação

É difícil apontar o momento exato em que o Coldplay se tornou a febre internacional que é até hoje. Em algum ponto, a banda deixou de escrever músicas intimistas sobre suas próprias paixões para lotar estádios pelo mundo com canções grandiosas, efeitos especiais e coros uníssonos pensados especialmente para as multidões — o que impactou diretamente na forma do grupo compor, gravar e pensar sua música.

“Music Of The Spheres”, o nono álbum de estúdio do grupo, segue exatamente a mesma fórmula. Produzido por Max Martin, um dos grandes nomes do pop atual, a obra representa um momento de retorno aos shows ao redor do globo, preparando o público para novas turnês e experiências visuais. Entretanto, o trabalho não se propõe a ser nada além disso: músicas feitas para cantar, vibrar e celebrar.

Há pelo menos uma década, o quarteto tem aproveitado o sucesso que construiu como uma das maiores sensações da música alternativa, distanciando-se das figuras tímidas e despretensiosas que conquistaram tão rapidamente o público. O disco nos apresenta à versão mais ambiciosa da banda e ao que, provavelmente, o Coldplay tem a nos oferecer até o fim de sua carreira: várias fórmulas pouco inspiradas entre alguns momentos de brilhantismo que fazem nos lembrar do que, um dia, já se propuseram a ser.


Um disco feito para os estádios

No início de sua carreira, Chris Martin cantava sobre olhar para as estrelas de seu próprio quarto na faculdade, sem muito ao seu redor além de um violão e um microfone. Em “Music Of The Spheres”, o vocalista não só idealiza planetas para cada faixa, como também canta sobre sintetizadores e instrumentais celestiais, criando uma atmosfera espacial para a sonoridade — um conceito que, por mais profundo que pareça ser, não chega a convencer em momento algum.

Ao mesmo tempo que o grupo dá vida a canções vibrantes e bem produzidas, as composições não acompanham a mesma densidade. “Higher Power” e “Humankind”, responsáveis pela abertura do trabalho, são dois exemplos de como alguns dos destaques musicais do álbum contam com letras simples demais ou até mesmo constrangedoras — felizmente, não o suficiente para deixar de se contagiar.

Apesar dos ânimos ao redor da faixa, “My Universe”, a tão falada colaboração com o BTS, percorre o mesmo caminho, assim como “People Of The Pride”, na qual o grupo flerta com o rock para criar um hino para os estádios. Todas essas são músicas feitas exclusivamente para os grandes palcos, com todos os seus artifícios pensados em como os coros ressoarão entre públicos de todo o mundo, entre diferentes idiomas e culturas.


Talvez, por isso, o Coldplay procure falar uma língua cada vez mais universal em suas obras, o que tem distanciado a banda de seus fãs mais antigos e os aproximado das massas. A produção de Max Martin reforça o propósito do grupo, criando melodias para serem ouvidas repetidamente e adicionando os versos mais pegajosos até mesmo nas faixas mais esquecíveis, como é o caso de “Biutyful”.

Até mesmo nos momentos mais sensíveis do álbum, Chris Martin assume uma escrita que todos os ouvintes possam se identificar. “Let Somebody Go”, esperada parceria com Selena Gomez, é um raro momento em que o vocalista se aprofunda minimamente em seus sentimentos, traduzindo em uma balada as mágoas que qualquer pessoa que já tenha passado por uma desilusão amorosa já enfrentou.

Para quem já entregou ao mundo grandes obras como “Parachutes”, “A Rush Of Blood To The Head” e “X&Y”, a cobrança é um fardo que seguirá o trabalho do cantor durante o resto de sua carreira. “Music Of The Spheres”, por sua vez, reúne algumas de suas composições mais rasas, prendendo-se às mesmas metáforas e ideias sobre as quais compõe há tempos, sem apresentar nada, de fato, inédito até o grande encerramento.


Uma eterna sombra para o Coldplay

“Coloratura” é o grande clímax do disco e, talvez, o ponto mais alto que o Coldplay alcançou nos últimos dez anos. A música é formada por diferentes camadas sonoras, acompanhando a construção de um épico apoteótico que parte de simples notas de piano até uma sonoridade panorâmica, representando um universo particular dentro da galáxia de “Music Of The Spheres”.

No decorrer dos dez melhores minutos do álbum, é impossível não se questionar como o grupo consegue oscilar tão facilmente entre o genial e o genérico. Desde o lançamento de “Mylo Xyloto”, em 2011, a inconsistência criativa tem sido uma marca da banda, e não porque perderam seu talento, mas porque preferiram seguir a direção oposta da que os consagrou.

Ao final de sua última turnê mundial, em 2017, a banda prometeu ser “o fim de um capítulo”, o que parecia justificar o fôlego artístico de “Everyday Life”, de 2019, e indicar um caminho inédito a ser seguido. Quatro anos depois, porém, o grupo volta para as mesmas fórmulas, sem grandes inovações — da mesma forma que “Ghost Stories”, o disco intimista de 2014, antecedeu “A Head Full Of Dreams”, lançado no ano seguinte com uma nova turnê internacional.


Trata-se, no fim das contas, de um debate completamente vão: no auge de sua fama, o grupo tem todo o direito de seguirem como quiserem e, certamente, tem todos os motivos para celebrar a vida em grandes shows pelo mundo com seus fãs. Contudo, sempre se esperará mais de quem já se mostrou ser um dos mais talentosos grupos do século, com força e criatividade suficientes para apresentar muito mais ao mundo.

Ainda não é possível dizer como o Coldplay será lembrado na história da música: como aquilo que poderia ter sido ou aquilo que se limitou a ser. Hoje, nenhum dos integrantes da banda parece se importar, mas sim desfrutar, felizes, do momento que vivem, com as multidões que os perseguem. “Music Of The Spheres” é feito para eles.

6 / 10

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *